terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Começo

Como começa uma volta ao Mundo? Provavelmente num qualquer aeroporto, cheio, demasiado cheio de gente que se atropela numa espécie de correria louca para ir a lado nenhum. Gente que vai ou que vem, começa ou termina uma jornada qualquer, muita que simplesmente nem sabe ao que vem ou ao que foi. Enfim, gente...
Sempre gostei de observar as pessoas que me rodeiam nos aeroportos. Bom, transportes em geral, mas aeroportos em especial, porque apesar de algo elitista acaba por ser aquele espaço onde todos se encontram. Desde o homem ou mulher de negócios, que chega a correr, sempre ao telefone, a ler, por detrás do ecrã do portátil, sempre ocupado, como se cada minuto daquela hora fosse mais importante que os da que se segue. Desde o imigrante acabado de aterrar, com um olhar pasmo de quem ainda não acredita que está e ainda a relembrar a ladainha que decorou para passar a fronteira, apesar de já a ter passado, mas ainda com a memória das infindáveis horas a praticar respostas a perguntas sem nexo que apenas se destinam a tentar evitar os sonhos dos outros. Seja como for, indesejáveis ou não, todos chegam com o olhar de pasmo e com aquele brilho nos olhos que apenas quem vive um sonho tem. Há também os que vão, com o olhar cansado de quem viveu o sonho mas sente saudade. Ou daqueles que vão prestar uma última homenagem aos que partiram sem avisar e não puderam esperar o seu regresso. Os que apenas voltam depois de viver o sonho que afinal não era o seu, regressando a si mesmos. Mas há muitos mais, há o turista, com a sua roupa tantas vezes ridícula de quem não quer saber de nada que não seja daquele momento de relaxamento. A criança que olha pasma, prestes a voar como os pássaros pela primeira vez. Os profissionais com demasiadas horas de voo a oferecer café e amendoins espelhadas naqueles olhos de cansaço imenso, ou dos que nunca sequer chegam a voar, apesar do cansaço ser o mesmo.
Enfim, gente, muita, por todos os lados. Os que vão porque têm de ser e os que deram tudo para poder ir. Os que vão mas queriam ficar, os que chegam sem nunca querer ter vindo. Os que estão de passagem e nunca nem sequer queriam parar aqui. Mas uma coisa existe de comum entre toda esta gente que se acotovela para fazer um check-in, se despe para passar na segurança, se aborrece à espera ou se distrai a olhar lojas com coisas que nunca quiseram comprar. Todos estão de passagem, mais ou menos tempo, de corrida ou com a calma que só o tempo ou a idade nos dá. Todos de passagem, entre uma origem e um destino, todos de viagem, na viagem sem destino sem dar por isso.
Uma volta ao Mundo começa provavelmente num aeroporto qualquer, ou muito provavelmente começa muito antes, no momento em que pela primeira vez os olhos brilharam ao passar uma fronteira, ao ouvir uma pessoa que fala algo que não se entende, mas com um sorriso de curiosidade. Começa no momento em que compreendemos o quão relativa é a nossa posição neste Mundo, o quanto temos para aprender com gente estranha, lugares distintos, cheiros e cores diversos. A minha começou assim, ao cruzar uma fronteira num dia qualquer do qual já não me lembro, e não mais parou. E assim nasceu um sonho, o sonho de correr o Mundo, um sonho de criança que se faz adulto agora, muitos anos depois, num qualquer aeroporto, com o destino Oeste na mente, percorrendo o planeta como Fernão o fez mas não em busca do caminho das especiarias por Ocidente, apenas do caminho de volta a Portugal, por onde a vontade e a sorte me levarem.

Londres, Reino Unido, Novembro 2008

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