sábado, 26 de setembro de 2009

O som do deserto

“Fechem os olhos”, disse ele, “e escutem o som do deserto.” Sentado na duna não foi difícil. Só tive de, imagine-se, fechar os olhos e ouvir. Ao começo um ligeiro assobio ecoava no meu ouvido. Era o som de 30 anos passados continuamente a ouvir escapes, gente, música, martelos-pneumáticos, gritos, televisão, aviões, cães, luzes, telemóveis, discotecas, conversas sem nexo, computadores, guitarras, paredes, calçadas, ruas e estradas, fábricas, campos e cidades, muito ruído, demasiado, todo junto, misturado agora num distante assobio. Aos poucos foi desaparecendo. O barulho do silêncio abafou o ruído de milénios de civilização e deixou tudo envolto numa calma imensa e no suave vento que soprava. Senti que o meu cérebro também se desligava e tudo o resto deixava de existir. Nem antes nem depois, nada, apenas aquele momento que durou um segundo mas me soube a séculos de descanso. “Vamos”. Acabou. O silêncio desapareceu à medida que o grupo começou a descer em corrida a duna, substituído por gargalhadas de criança que também os adultos soltaram. Mas no final de contas o silêncio continuará aqui neste deserto e dentro de cada um de nós, só temos de querer escuta-lo.


San Pedro de Atacama, Chile, Julho 2009







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