sábado, 18 de abril de 2009

Uma qualquer lenda...

Olhando estas águas que caem sem parar ponho-me a pensar como tudo terá começado por aqui... Os índios Guarani tem a sua explicação numa linda lenda que poderia transcrever aqui, mas resolvo antes tentar criar a minha. Fecho os olhos, sinto a água salpicar a minha cara e deixo que a imaginação me leve por ai abaixo...


"No tempo em que os deuses ainda vagueavam pela terra havia um rio. Era mais um riacho, daqueles pequenos, que serpenteava vagarosamente por entre raízes e pedras, sem pressa nem destino, apenas indo. Até porque o que ele gostava mesmo era de sentir cada curva do caminho, cada lugar por onde passava. Deliciava-se a sentir as diferentes temperaturas, texturas e sabores de cada pedra, cada árvore, cada grão de terra, cada animal que nele matava a sede. De tão feliz este riacho começou aos poucos a suspirar de alegria, em especial no seu local favorito onde uma pedra rosada o fazia sentir diferente, feliz, numa alegria tal que nem ele sabia explicar. A pedra também adorava sentir o riacho passar, deixando-se envolver, sentindo a frescura deliciosa que cortava o calor abafado daquela floresta. Um dia sem saber como eles apaixonaram-se. O riacho corria mais depressa apenas para a encontrar e a pedra, ansiosa, respondia ao seu suspiro com um doce canto, esperando que assim o riacho nunca dela se perdesse.
Certo dia um deus qualquer, vagueando pela terra, ouviu ao longe um doce canto. Parou, investigou de onde vinha e logo deu com a pequena pedra rosada. Tao lindo era o seu cantar que logo se apaixonou. Passou a vir todos os dias só para a ouvir, ficando mais e mais tempo. Tanto tempo passou que logo se apercebeu que a pequena pedra não cantava para si mas que canto e suspiro eram um só, fruto de uma paixão que não era a sua. Irado pela inveja, o deus decidiu arrancar a pedra para consigo a levar para longe, para dele ser para sempre, dele e de mais ninguém. Mal o fez e logo a pedra chorou, de dor e tristeza, por não sentir junto de si o seu amado. Chorando suplicou para que a devolvesse ao seu lugar, pois não poderia mais viver longe do seu riacho. Ao ouvir isto o deus, aturdido pela ira da inveja e do despeito, disse gritando: "Pois se minha não queres ser, para sempre viver na glória da minha companhia e beleza eternas, também não serás de mais ninguém!" E fechando o punho esmurrou a pequena pedra contra o chão, afundando-a na cratera enorme que abriu, escondendo-a para sempre do seu amado riacho.
Ao ver tudo isto na impotência de algo poder fazer o riacho soltou um rugido de dor imenso, ouvido por toda a parte. E chorou, chorou, chorou sem parar. Ao ouvir tal rugido, tanto choro, seus irmãos, primos, vizinhos, todos vieram ver o que se passava. Ao chegarem o riacho entendeu que ganhava força e que se mais riachos viessem em seu auxilio talvez todo juntos pudessem escavar a rocha e encontrar a sua amada. Assim todo juntos rugiram, chamando mais e mais riachos, crescendo o seu caudal que descendo vertiginosamente o precipício começava a escavar o fundo.
Ainda hoje o então riacho corre sem parar, usando a sua força e dos seus irmãos e amigos na busca incessante pela sua amada. Ninguém sabe ao certo se já se encontraram, mas há quem diga que riacho e pedra vivem alegremente debaixo do leito do Iguaçu, escondidos por detrás das cataratas, enquanto a grande água aplaude sem parar o doce canto dos namorados."

Cataratas do Iguaçu, Brasil/Argentina, Março 2009








Sem comentários: